Custo do Produto: já é tempo de exorcizar este fantasma contábil
Pense por um instante em um mundo onde não fosse necessário calcular o custo unitário dos produtos que vendemos. Nada de complicadas operações contábeis para distribuir o “overhead” às unidades vendidas, ou a determinados centros de custos. Não teríamos que medir os tempos de processamento, com a finalidade de repartir o custo da “mão-de-obra” direta a cada unidade de produto; imagine! Aposentaríamos o Custeamento ABC e toda a pesada manutenção do sistema informático que o suporta. Esse mundo parece ser o Planeta Carochinha, mas não é. É o nosso mundo mesmo, porém livre das distorções da ultrapassada “Mentalidade do Mundo de Custos”. É o que pretendo demonstrar brevemente neste artigo.
Em uma edição anterior (“Para reduzir custos, não priorize a redução de custos”), citei de passagem o que aprendi de Eli Goldratt, pai da Teoria das Restrições: o “custo do produto” é um fantasma contábil. Embora tenham seu charme para trazer suspense a conversas entre amigos, os fantasmas são seres dispensáveis (exceto para aqueles que cultivam o mórbido prazer de conviver com eles). A Figura 1 ajuda a visualizar o motivo pelo qual podemos (e devemos) mandar, para os porões do esquecimento, o cálculo do custo unitário do produto – CP(u). Para chegar a ele, dividimos o GO – o Gasto Operacional fixo que temos que pagar num dado período – pela quantidade N de unidades vendidas no mesmo período (neste caso estamos usando o volume de vendas como critério de distribuição do gasto fixo, mas poderia ser usado qualquer outro critério, como por exemplo o tempo de “mão-de-obra direta”). Ao GO(u) resultante adicionamos o CTV(u) – Custo Totalmente Variável (valor da matéria-prima, comissão de vendas ou outros custos que variam em proporção direta a cada unidade vendida), e assim obtemos o CP(u). E, para saber que margem de lucro unitária podemos obter, calculamos a diferença entre CP(u) e o Preço de Venda unitário, PV(u). No caso da Figura 1, essa diferença resulta negativa (visualmente), e assim chegamos à conclusão que não seria rentável praticar o valor PV(u) ilustrado. Suponhamos que esse é o preço máximo proposto por um cliente. Concluímos, então, que deveríamos recusar o negócio (dizer “não” para o cliente), para não prejudicar a lucratividade da empresa. E é justamente nesse ponto que nos tornamos vítima do fantasma! Pois, em nome da “eficiência de custo” representada pelo CP(u) jogamos pela janela uma real oportunidade de aumentar a lucratividade! Explico através dos seguintes argumentos:
- Em primeiro lugar, o Gasto Operacional GO não tem nada a ver com as vendas, pois no final do período teremos que pagar o valor GO, quer vendamos ou não. Portanto, a alocação de GO às N unidades vendidas é totalmente arbitrária, não importa o critério de alocação que definamos.
- Em segundo lugar (diferentemente do que ocorria no início da Revolução Industrial – quando foi inventada a Contabilidade de Custos), na atual realidade de negócios, GO é uma grande parcela dos custos totais de uma empresa, e a fração GO(u) distorce completamente nossa percepção da realidade e, via de regra, nos leva a tomar a pior decisão! Note que, na Figura 1, ao somar GO(u) para calcular CP(u), perdemos de vista o fato de que a diferença PV(u) – CTV(u), a “margem de contribuição” unitária, que chamaremos de “Throughput Unitário” T(u), é positiva. Assim, ao recusar o negócio, o que de fato aconteceu não foi que evitamos a perda de N x LL(u), mas sim que desperdiçamos a oportunidade de ganhar N x T(u), que afinal nos ajudaria a pagar o GO. Decisão equivocada, causada por um paradigma obsoleto, mas que por incrível que pareça ocorre todos os dias na maioria das empresas, ainda hoje…
Qual seria, então um melhor modelo analítico? De novo, uma figura vale mais que mil palavras: a Figura 2 ilustra o paradigma do Throughput, que tem o poder de exorcizar o fantasma do custo do produto. Iniciamos calculando o T(u), o throughput unitário: a diferença entre PV(u) e CTV(u). Vale ressaltar aqui que CTV(u) não envolve nenhuma distribuição de custos de qualquer espécie; apenas os custos que incorrem a cada unidade vendida. Multiplicando T(u) pela quantidade vendida N, obtemos o throughput total – T(total) na figura – do qual subtraímos GO para obter LL(total), o lucro líquido final. Note que esta forma de análise mostra com fidelidade o real impacto da decisão (neste caso, aceitar ou não a proposta de negócio). Além disso, não tivemos que fazer qualquer consideração sobre o custo unitário do produto: CP(u) simplesmente não aparece na figura! Portanto, no mundo do Throughput não existe esse fantasma contábil, e assim ficamos livres de todas complicações, custos e atrasos causados pelo pesado sistema de alocação de custos. Esse novo paradigma revela a simplicidade inerente no que tange avaliar o impacto que qualquer proposta específica terá sobre o lucro líquido global da empresa (uma “ponte” difícil de fazer sob o esquema tradicional da Contabilidade de Custos). Em qualquer decisão ou proposta, basta estimar DGO, o aumento do GO causada pela decisão (apenas o valor global, sem qualquer alocação de custo) e o correspondente DT, o aumento do throughput global. Se DT–DGO (o lucro líquido causado pela decisão) é positivo, trata-se de uma boa idéia. Caso contrário, não.
Preciso, fácil, rápido, elegante e… vergonhosamente simples! Faça um teste: calcule o T(u) de pelo menos uma amostra dos produtos de sua empresa, e veja se isso lhe traz uma nova perspectiva em relação a quais produtos deveríamos dar prioridade na comercialização. O resultado normalmente traz surpresas…
E você? O que pensa sobre este tema? Qualquer comentário será muito bem-vindo.
Até a próxima edição!
Eduardo C. Moura
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