Melhoria organizacional e mentalidade empresarial

Posted By Eduardo Moura in Blog | 2 comments



Melhoria organizacional e mentalidade empresarial


Eduardo-MouraComo dizia o Dr. Deming: “Não é preciso mudar. A sobrevivência não é mandatória…” Mas principalmente em tempos de crise, onde se percebe de maneira mais contundente que a sobrevivência do negócio está mais seriamente ameaçada, as empresas buscam a mudança de maneira mais intensa, sentindo que as coisas não podem ficar como estão. Portanto, é sempre relevante perguntar: “Que aspectos em nossa empresa devem ser mudados? Por onde devemos começar o processo de mudança?”. Bem, as respostas para isso são as mais diversas possíveis, mas vou me concentrar em três caminhos por onde não se deve começar, e depois apontar para um que deveria ser a pedra fundamental de tudo.
Em primeiro lugar, não se deve tentar iniciar um processo de mudança organizacional com discursos exortativos e apelos emocionais para a “mão de obra”. Os altos executivos que começam por aí estão assumindo pelo menos três premissas completamente falsas: a) que o grande fator de sucesso para a mudança está nas mãos do pessoal de “chão de fábrica”; b) que esse pessoal sabe exatamente o que deve fazer de diferente em relação ao que sempre fizeram; c) que até hoje eles não se propuseram a buscar melhorias porque lhes faltou um estímulo externo por parte da alta direção. E que estímulo poderia ser mais fácil, rápido e barato que um discurso do presidente? Mas virtualmente todos os que trilharam esse caminho fracassaram rotundamente. Diz o ditado que um ato vale mais que mil palavras, isto é: as pessoas estão olhando muito mais para os nossos pés e mãos que para nossos lábios… Não é à toa que um dos 14 princípios de W.E. Deming é “acabe com as campanhas exortativas para o pessoal”.

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A segunda maneira pela qual não se deve tentar iniciar um processo de mudança organizacional é através do estabelecimento e cobrança de metas numéricas de melhoria, como já discuti em vários artigos anteriores. Novamente, ao fazerem isso os altos executivos estão assumindo premissas absolutamente equivocadas: a) que eles sabem a priori exatamente quanto (e até em que prazo) é possível melhorar, sem nem mesmo haver definido como será realizada a melhoria (!); b) que as pessoas são desmotivadas e apáticas por natureza e só se mobilizarão se houver uma pressão pelo cumprimento de metas numéricas. Ora, fazer isso é reduzir a ciência e a arte de gerenciar a um ordinário agendamento de enfadonhas reuniões de “status review” que invariavelmente vão causar enormes desperdícios de tempo para preparar lindas apresentações com números frequentemente maquilados ou projeções fictícias, e que a médio prazo vão criar um exército de pessoas defensivas, que tudo o que fazem é buscar uma forma de “tirar o seu da reta”. Com muita razão, Deming já preconizava: “elimine as quotas numéricas para o pessoal”.
Em terceiro lugar, não se deve tentar iniciar um processo de mudança organizacional através de mais incentivos monetários. Isso rapidamente vai produzir um bando de mercenários que só se mobiliza se lhes for respondida a pergunta: “o que é que eu levo no meu bolso pra fazer isso?”. Todos nós queremos ter um pessoal motivado, mas… motivado para quê? Se for para pedir cada vez mais bônus, este é o caminho certo. Mas se for para ter uma equipe de águias que todos os dias alçam vôos de criatividade para buscar melhorias e sentir prazer em vê-las implementadas, estamos na contramão da psicologia da motivação humana. Do alto de sua experiência, o venerável Herzberg dispara um conselho radical: “se você quer realmente motivar seu pessoal, esqueça os incentivos monetários.”
Quero ressaltar a esta altura dois fatos que frequentemente passam desapercebidos com relação aos três caminhos expostos até aqui. Primeiro: tratam-se de falsos caminhos. Não passam de tentativas de requerer mudança, sem na verdade mudar coisa alguma! Já foi dito que a definição popular de insanidade é esperar resultados melhores, fazendo sempre as mesmas coisas. Nada vai mudar de fato com mais discursos, mais incentivos ou imposição de metas mais agressivas. E segundo: aqueles três falsos caminhos compartilham da mesma falácia de achar que “os outros” é que devem mudar, e não as próprias cabeças que tão desesperadamente reconhecem a necessidade e requerem a mudança, a saber: os membros da alta direção! Justamente por ocuparem uma posição de destaque tão arduamente conquistada, a grande maioria dos altos executivos acabam contraindo a “síndrome do sucesso”, um tipo de orgulho exacerbado que lá no fundinho de suas mentes implantou o estranho conceito de que já não há nada mais que eles possam aprender, e que os leva a inferir que eles já sabem exatamente o que fazer em cada situação, bastando uma rápida análise e tomada de decisão. Por isso é que uma verdadeira raridade ver um alto executivo sentado como estudante numa sala de treinamento. Mas o verdadeiro sábio é um estudioso insaciável, um eterno aprendiz. E o primeiro passo para aprender é reconhecer que não sabemos o suficiente, que há coisas novas e importantes a aprender, que existe um maneira superior de fazer as coisas. Deming dizia que o conhecimento necessário para a transformação do sistema sempre vem de fora… e por convite!
Tenho constatado inúmeras vezes que a estrutura de trabalho influencia e determina o comportamento observado na base operacional. E são os líderes empresariais que definem a estrutura de trabalho (políticas, organização, processos, recursos, ambiente físico etc.). A estutura é o reflexo do que eles pensam, do que eles são. Se uma dada estrutura não produz resultados satisfatórios, ela precisa ser mudada em algum aspecto. E para que seja implementada uma nova estrutura é necessário uma mudança pessoal em cada líder. É verdade que existe uma certa margem de melhorias que podem ser conseguidas com mudanças dentro da própria estrutura vigente. Mas chega um momento em que é preciso realizar um salto qualitativo, e isto requer uma mudança radical no próprio conceito da estrutura. Porém, a decisão de fazer mudanças estruturais profundas nos sistemas de trabalho só acontecerá se, antes, os altos executivos entenderem e adotarem novos princípios administrativos, e decidirem agir de maneira coerente com uma nova filosofia. Mais uma vez, Deming estava coberto de razão. Entre seus primeiros princípios para transformação da administração está: “adote a nova filosofia”. É por aí que começam as mudanças sólidas, as melhorias consistentes e expressivas no desempenho organizacional.
Lean, Seis Sigma, Teoria das Restrições e Gestão por Processos são abordagens de melhoria organizacional que trazem, cada uma delas, todo um conjunto de princípios, métodos e ferramentas analíticas. Seu aspecto mais evidente (e fácil) são os métodos e as ferramentas. Mas o segredo do sucesso está nos princípios, na forma de pensar, na “filosofia”. É relativamente fácil aprovar um orçamento de treinamento, contratar senseis, formar Green Belts e Black Belts e cobrar deles certas metas de melhoria. Porém é muito mais difícil abrir a cabeça para entender novos conceitos, aprender e começar a praticar novos princípios, passar a ver as pessoas de outra forma, mudar a maneira como temos agido durante grande parte de nossa carreira profissional, e em função disso criar novas estruturas de trabalho. Não adianta nada (a longo prazo) ou quase nada (a médio prazo) dar treinamento para o pessoal da base, fazer projetos de melhoria, eventos Kaizen etc, se a alta cúpula não estiver de cabeça aberta para a mudança de sua própria forma de pensar, decidir e agir. Deveríamos reconhecer que não existe melhoria substancial sem mudança da mentalidade empresarial.

Até a próxima edição!
Eduardo Moura
[email protected]


Tag: Melhoria organizacional e mentalidade empresarial

2 Comments

  1. Achei muito interessante e coerente .
    Gostaria de sugerir que vc. oferecesse seus serviços à uma empresa, que ao meu ver está precisando muito, porém não sabe.
    É uma multi-nacional, com sede na Inglaterra, no Brasil, na Africa etc…
    Estarei enviando um e-mail

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  2. Eduardo Moura, muito bom!!!

    Concordo plenamente!!!

    É meu caro, conhecer novos conceitos é uma coisa, assimilá-los e aplicá-los já é uma outra conversa… Desde quando existem os 14 princípios de Deming? E os conceitos de qualidade?

    Com o tempo a gente chega lá. 😉

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