Vá ao “gemba” e conheça seu cliente!
“A escrivaninha é um lugar perigoso para se adquirir uma perspectiva do mundo.” (John Le Carré)
Tirei esta citação de um livro de frases famosas. Não conheço John Le Carré, mas ele tem razão. Fato agravado com a era da televisão e da informática, estamos muito acostumados a tirar conclusões e tomar decisões a partir de dados, informações ou relatórios obtidos “via sistema”. Outra citação interessante, da qual infelizmente desconheço o autor, diz mais ou menos o seguinte: “É preciso entender que a empresa é uma entidade social complexa, formada pelas relações com seus clientes, funcionários, fornecedores, acionistas, pessoas que dependem da organização…. A grande maioria dos executivos reduziram a empresa a um simples conjunto de indicadores financeiros que aparecem na tela de um computador”.
Para reforçar ainda mais o ponto, forneço um outro exemplo: partindo da preocupação em saber como os clientes avaliam seus produtos e serviços, é prática comum que as empresas contratem agências especializadas em pesquisa de mercado. Estas, por sua vez, frequentemente subcontratam estagiários ou estudantes para aplicarem questionários (pré-concebidos) aos clientes da empresa. Os questionários são em seguida tabulados e transformados em inúmeras estatísticas que compõem um relatório volumoso fornecido à empresa. Via de regra, o relatório apenas confirma o que já sabia sobre os pontos previamente colocados no questionário. Coisas importantes que os clientes disseram (ou tinham a dizer) durante o contato pessoal passam completamente desapercebidas, pois as pessoas que fizeram o levantamento de dados não tinham o mínimo conhecimento a respeito dos clientes, do mercado e da empresa que contratou o serviço. Além do mais, é impossível reduzir a estatísticas a ampla e complexa realidade vivida pelos clientes em sua interação com o produto. E os usuários finais de tal relatório, em seus confortáveis escritórios, se contentam com a interpretação da interpretação que os profissionais de pesquisa fizeram do que seus clientes opinaram. Resultado: consolida-se um abismo perigoso entre a realidade do cliente e as decisões da empresa. Creio que a esta altura, por analogia e experiência própria, o leitor pode concluir que situações similares ocorrem em relação aos funcionários da empresa, seus fornecedores e demais partes interessadas.
“Gemba” (pronuncia-se guemba) é uma palavra japonesa que mais ou menos significa “o local onde ocorre a ação”. É interessante notar que os dois ideogramas que compõem esta palavra mostram um senhor feudal observando seus súditos, transmitindo a idéia de “observar aqueles a quem estamos servindo”. Inspirada pelo caráter contemplativo e criativo de um de seus fundadores, a Toyota derivou o princípio “genchi genbutsu”, que significa “vá ver com seus próprios olhos”. Para ter uma idéia de como isto é praticado nesta empresa modelo, o engenheiro chefe responsável pelo desenvolvimento do utilitário RAV4 passou seis meses morando na casa de uma família da classe média americana, antes de criar o conceito do veículo.
Concluindo: não importa qual seja o nível hieráquico de alguém que quer tirar uma conclusão ou tomar alguma decisão, é preciso ir ao gemba (pessoalmente) e observar o que está acontecendo lá, na prática, investindo para isto o tempo que for necessário. Executivos: saiam do “Olimpo” e vão observar e conversar com seus clientes e colaboradores. Engenheiros de produto: saiam detrás de seus computadores e observem atentamente o gemba do cliente e também o gemba da produção. E o apelo poderia estender-se a virtualmente qualquer função de qualquer organização que tenha diante de si clientes internos ou externos. Finalizo com minha particular tradução de “genchi genbutsu”: levante o traseiro da cadeira e vá ao gemba!
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Eduardo Moura.
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